Da Prisão Ao Palácio: Os Detalhes Desconhecidos
Por Julia Blum
A próxima seção da saga de José começa no final de
dois anos completos, quando o Faraó sonhou. No entanto, há uma ligeira
diferença quando lido em Hebraico: (מִקֵּץ
שְׁנָתַיִם יָמִים; mikétz shnatáim yamím)
—no final de «dois anos de dias»—. A palavra yamím, «días», não ocorre em
nenhuma tradução. As traduções falam apenas de «dois anos», enquanto o texto
original fala de «dois anos de dias». Por quê?
A próxima seção da saga de José começa no final de dois
anos completos, quando o Faraó sonhou. No entanto, há uma ligeira diferença
quando lido em Hebraico: (מִקֵּץ שְׁנָתַיִם יָמִים; mikétz shnatáim yamím) —no
final de «dois anos de dias»—. A palavra yamím, «días», não ocorre em nenhuma
tradução. As traduções falam apenas de «dois anos», enquanto o texto original
fala de «dois anos de dias». Por quê?
O texto Hebraico aqui transmite uma verdade muito
profunda: para José, esses dois anos de prisão consistiram em muitos dias
únicos, dias cheios de angústia, dor, novas esperanças e novas decepções. Todos
os dias ele tinha que escolher confiar em Deus, não importando o quão exausto ou
desapontado estivesse. A palavra «dias» aqui nos assegura que Deus viu todos os
dias da prisão de José: Ele conhecia a dor e a angústia de cada um desses dias.
Não somos todos assim? Embora nossa vida seja medida por
anos, esses anos consistem em dias, dias cheios de desafios e escolhas,
esperanças e decepções. Todos os dias temos que escolher confiar nele, muitas
vezes, apesar de nossas circunstâncias e apesar de toda a dor, angústia e
decepções que possamos ter. Ainda hoje, em Hebraico, a palavra «dias» é
frequentemente adicionada quando se fala de tempo: uma semana de dias, um mês
de dias. שבוע ימים, חודש ימים. A beleza e a profundidade do Hebraico transmitem
uma mensagem clara: embora nossa vida seja medida por anos, meses e semanas,
esses anos, meses e semanas consistem em dias cheios de desafios e escolhas,
esperanças e decepções e Deus vê e sabe a dor de cada um desses dias.
O novo nome de José
Muito impressionado com José, Faraó disse a seus servos:
«Podemos encontrar alguém como este, um homem em quem está o Espírito de
Deus?». Assim, o mesmo padrão que vimos duas vezes antes nesta história, é
repetido novamente aqui:
O Senhor esteve com José quando ele esteve diante de
Faraó.
Faraó viu que o Senhor esteve com José.
Portanto, Faraó entregou tudo em suas mãos.
Como um sinal da nova identidade de José, «Faraó… deu a
José o nome de Tzafán-panéaj». Não há acordo entre os Egiptólogos quanto ao que
este nome pode realmente significar, e até hoje não houve uma interpretação
aceita por todos. A antiga tradição interpretativa Judaica, entretanto, deriva
o nome Tzafán-panéaj de raízes Hebraicas (e não Egípcias): (פִּעְנֵחַ; panéaj)
y (צפן; tzafán). Quais são os significados dessas raízes?
Tzafán significa «esconder, guardar ou armazenar».
Encontramos um bom exemplo nas conhecidas palavras de Salmos 119: «Tua Palavra
escondi em meu coração...». (em Hebraico é: בְּ֭לִבִּי צָפַ֣נְתִּי; belibí
tzfánti…). Panéaj significa «decifrar; descobrir, resolver; decodificar,
interpretar». Assim, Tzafán-panéaj, o nome Egípcio de José, pode ser traduzido
como: «Aquele que explica as coisas ocultas». Esse realmente poderia ser o nome
que Faraó daria a José, afinal, ele interpretou os sonhos do Faraó. Além disso,
este nome também pode ser traduzido como «A revelação do oculto». Então, isso
refletiria não apenas a compreensão do Faraó sobre José, mas todo o plano de
Deus nesta história.
Esquecer a casa de meu pai
Quando, depois de todo o sofrimento e provações de José,
finalmente o vemos sendo bem-sucedido e influente, somos surpreendidos por um
detalhe muito interessante nesta narrativa. Quando seu primeiro filho nasceu no
Egito, José o chamou de Manassés: «Deus me fez esquecer (נשני; nasháni) de
todos os meus trabalhos, e de toda a casa de meu pai». Esquecer a casa de seu
pai! José não amava seu pai? Por que ele queria esquecê-lo? Além disso, por que
José não contatou Jacó durante todos esses anos?
Mais uma vez, gostaria de lembrar a vocês que José não
sabia o que nós, leitores, sabemos, ele não sabia que seus irmãos haviam
enganado seu pai e que Jacó pensava que José estava morto. Ele provavelmente
estava se perguntando, especialmente durante seus primeiros anos de escravidão:
«Por que meu pai não procura por mim?». O Egito é tão perto de Canaã que José
provavelmente esperava que seu pai fosse procurá-lo, mas, como isso nunca
aconteceu, José pode ter se convencido que o próprio Jacó estava envolvido na
trama. Afinal, foi seu pai quem o enviou para verificar os irmãos. José sabia
que seu pai o amava, mas ele também conhecia as histórias dos pais: Abraão
amava Ismael, mas Deus escolheu Isaque; Isaque amava Esaú, mas Deus escolheu
Jacó. José sabia que se fosse a vontade de Deus que ele fosse banido de sua
família, seu pai aceitaria e obedeceria a essa vontade.
Só quando os irmãos chegaram, José percebeu que Jacó não
sabia nada sobre o crime. Agora ele estava ansioso para resolver seu
mal-entendido, talvez até mesmo para pedir perdão e é por isso que sua primeira
pergunta foi: «vive ainda meu pai?».[1]
Os filhos de José
Durante a celebração do sabbat nas noites de sexta-feira,
os pais Judeus abençoam todos os seus filhos com a bênção sacerdotal.[2] As
linhas introdutórias desta bênção dependem se a criança é menino ou menina.
Para meninos, a linha introdutória é:
«Que Deus o torne como Efraim e Manassés!».
Por que os pais Judeus abençoam seus filhos com os nomes
dos filhos de José? Por que os filhos de José foram escolhidos para essa bênção
em vez dos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó?
Dois filhos nasceram de José no Egito. Em primeiro lugar,
vamos tentar entender o significado original em Hebraico de seus nomes. José
chamou o nome do primogênito Manassés.[3] O nome Menashe (Manassés) é derivado
da raiz Hebraica נָשָׁה: «fazer esquecer». José queria esquecer todo o
sofrimento e aflição que ele passou. É por isso que ele chamou seu filho de
Manassés.
O nome do segundo foi Efraim.[4] O nome Efraim é derivado
da raiz פָּרָה «tornar frutífero». Evidentemente, José foi capaz de esquecer
seu sofrimento e seguir em frente: tornar-se fecundo e produtivo na terra
estrangeira. Além disso, o fato de que Efraim e Manassés são os primeiros
irmãos na Torá cujo relacionamento não é marcado por ciúme e rivalidade,
apresenta um poderoso testemunho da paz no coração de José e na casa de José.
E ainda, há algo mais sobre esses irmãos, algo que os
transformou em um paradigma para bênçãos. Esses dois filhos cresceram no
exílio, completamente separados de sua extensa família, mas obviamente
permaneceram fiéis a Israel e ao Deus de Israel. Portanto, antes de sua morte,
Jacó seleciona os dois filhos de José para as bênçãos ao longo dos tempos. Há
uma mensagem poderosa nesta bênção. Quando dizemos aos nossos filhos: «Que Deus
os torne como Efraim e Manassés», desejamos que eles estejam sempre
espiritualmente conectados ao seu povo e a seu Deus, independentemente de onde
vivam e cresçam.
[1] Gênesis 45:3.
[2] Números 6:24-26.
[3] Gênesis 41:51.
[4] Gênesis 41:52.