Aprendendo a amar
“E amarás o Eterno,
teu Deus, com todo o teu coração…”(Deuteronômio 6:5)
Na Torá, somos
ordenados a amar. Amar a Deus, amar o próximo, amar o convertido… Como pode
ser? No mundo atual, somos bombardeados com referências que insistem que o amor
é espontâneo, incompreensível, talvez até mesmo mágico. Como então podemos ser
obrigados a sentir um amor verdadeiro desta forma? Será que podemos aprender a
amar?
“E amarás ao teu
próximo como a ti mesmo”(Levítico 19:18) é, em hebraico, Veahavtá lereachá
camôcha. É utilizada a preposição LE־reachá, ao teu próximo, e não o artigo ET
reachá, o teu próximo. A letra lamed, cujo som corresponde ao L, quando usada
nesta construção, tem o significado da preposição “para”. Portanto, amar é agir
para alguém, e amor é doação. Talvez este seja o melhor sinônimo ou significado
da palavra, de acordo com a Torá – amar é dar.
Um dos amores mais
naturais e óbvios que podemos usar como exemplo é amor maternal ou paternal.
Quando nasce um bebê, seus pais têm de suprir todas as suas necessidades.
Passam meses trocando fraldas, alimentando, dando banho, fazendo uma série de
ações para o bem do bebê sem receber nenhum tipo de reconhecimento, às vezes
nem mesmo um sorriso, apenas mais fraldas sujas e mais choro inconsolável. E
não há ninguém no mundo que eles amem mais. Eles continuam lá, firmes e fortes,
dando de si, de seu tempo, para aquela pequena criatura. Quanto mais eles se
dedicam ao filho, mais o amam, pois o ser humano aprecia tudo aquilo pelo que
se esforça a fazer. Os pais passam a vida se dedicando aos filhos, por isso
esse amor nunca diminui ou se extingue, só cresce e se intensifica.
Mas e o amor que não
é natural, como por exemplo aquele que se desenvolve a partir de uma atração,
ou mesmo do sentimento de paixão? Num relacionamento amoroso, nos traz
satisfação agradar nosso parceiro, presenteá-lo, aprimorar nossas
características para atender às suas necessidades, sair de nossa zona de
conforto para suprir suas vontades. Nos doamos continuamente, cultivando assim
esse sentimento e desenvolvendo constantemente esta relação. Esse mesmo
raciocínio vale para o amor presente em uma amizade, em que investimos nosso
tempo e interesse e recebemos em troca convivência e atenção de alguém cuja
companhia nos traz conforto e alegria.
O nome da letra lamed
corresponde à raiz Lamad, do verbo Lilmod, estudar, aprender. Coincidência?
Claro que não, pois podemos aprender a amar qualquer um, é só nos doarmos para
alguém, investir nosso tempo e esforço em um relacionamento. Um dos grandes
psicanalistas, filósofos e sociólogos do século XX, Erich Fromm, escreveu: “O
primeiro passo é tornar-se consciente de que o amor é uma arte, assim como a
vida é uma arte. Se queremos aprender a amar, devemos proceder da mesma forma
como se fôssemos aprender qualquer outra arte, como a música, pintura,
carpintaria ou a medicina e engenharia.”
Para manter este
amor, é só continuar esta fórmula. Para um relacionamento amoroso perdurar é
necessária a constante doação de um indivíduo para o outro; um intermitente
esforço, às vezes maior e mais significativo, às vezes menor e mais natural,
porém sempre presente.
O Cântico dos
Cânticos é um dos livros mais românticos da Bíblia Hebraica. Ele foi escrito
pelo Rei Salomão e descreve a relação de amor entre Deus e o Povo Judeu usando
como metáfora a relação de amor entre um homem e uma mulher. Dentre os
versículos mais famosos está Ani Ledodi Vedodi Li, “eu sou para o meu amado e
meu amado é para mim” (Cântico dos Cânticos 6:3).
Novamente podemos ver
a preposição le, nos mostrando que o amor é esse relacionamento de doação
recíproca. E aqui aprendemos mais uma lição: se Ani Ledodi –se demonstrarmos
nosso amor, continuarmos nos dedicando a alguém, então, e certamente, Dodi Li –
seremos também amados. E quando isso acontece, essa é a verdadeira união. Não é
por acaso que a guematria (valor numérico) da palavra ahava, amor, é 13, mesmo
valor da palavra echad, um.
O amor é um
sentimento poderoso, capaz de revolucionar o mundo. Somos ordenados por Deus a
amar, a dar de nós aos nossos semelhantes. O objetivo de todos nessa vida é
justamente amar, dar, fazer o bem, todos os dias, indiscriminadamente. Podemos
praticar com nossos familiares, amigos, com animais de estimação, vizinhos,
colegas… e aprender, assim, qual o verdadeiro significado de amar a Deus.
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