Revisando a História
da Mulher Samaritana (João 4)
Dr. Eli
Lizorkin-Eyzenberg
O capítulo que relata
a história de Jesus encontrando a mulher Samaritana junto ao poço de Jacó, em
João 4, começa definindo o cenário para o que acontecerá mais tarde em Samaria
e está firmado no que aconteceu na Judeia no tempo em que já se desenvolvia o Evangelho. A popularidade
crescente de Jesus resultou em um significativo número de seguidores.
Seus discípulos
realizaram um antigo ritual Judaico de lavagem cerimonial com água, assim como
fez João Batista e seus discípulos. O ritual representava a confissão dos
pecados das pessoas e seu reconhecimento da necessidade do poder purificador do
perdão de Deus. Quando ficou claro para Jesus que as multidões estavam se
tornando maiores, mas especialmente quando soube que muitos fariseus estavam
alarmados, ele decidiu que era hora de ir para a Galiléia para continuar seu
ministério (versículos 1-3).
Geografia
O texto simplesmente
diz que Jesus “teve de passar por Samaria” (vs.4). Talvez, neste momento uma
curta aula de geografia seja útil. As terras Samaritanas ficavam entre as
terras da Judéia e da Galiléia. O caminho contornando Samaria levava o dobro do
tempo, ao invés dos três dias necessários indo direto da Galiléia a Jerusalém,
porque evitando Samaria era preciso atravessar o rio Jordão duas vezes para seguir
um caminho a leste do rio (Vita 269). O caminho através de Samaria era mais
perigoso, porque eram comuns os ânimos se exaltarem entre Samaritanos e Judeus
(Ant. 20,118; Guerra 2.232). Não nos é dita a razão pela qual Jesus e seus
discípulos precisavam passar por Samaria. João simplesmente diz que Jesus
“tinha que ir”, implicando que para Jesus isto não era comum. Talvez Jesus
precisasse chegar à Galiléia relativamente rápido. Mas o texto não nos dá
nenhuma indicação de que ele tinha um convite pendente para um evento na
Galiléia para o qual ele estava atrasado. Ele saiu quando sentiu a iminência de
um confronto com os fariseus sobre a sua popularidade entre os Israelitas. Isto
estava associado à compreensão de Jesus que o tempo para tal confronto ainda
não tinha chegado. Na mente de Jesus, o confronto com a liderança religiosa da
Judéia, (e não se enganem sobre isso, os principais fariseus eram parte
integrante de tal liderança) neste momento era prematuro e que muito precisava
ser feito antes de ir para a cruz e beber do cálice da ira de Deus, em nome da
antiga aliança com o povo e as nações do
mundo. A maneira como Jesus via os Samaritanos e seu próprio ministério entre
eles pode nos surpreender à medida que continuamos a examinar esta
história.
Sabemos que os
movimentos e as atividades de Jesus foram todas feitas de acordo com a vontade
e a liderança do Pai. Ele só fez o que viu o Pai fazer (Jo 5: 19). Sendo este o
caso, podemos estar certos de que a jornada de Jesus através de Samaria, neste
momento foi dirigida por seu Pai e assim, também, foi a sua conversa com a
mulher Samaritana.
A surpreendente
jornada de Jesus através de território
hostil e herético tem um significado além de qualquer explicação superficial.
Em um sentido muito real, desde o momento que Seu filho real foi eternamente
concebido na mente de Deus, o plano
insondável de Deus e sua missão, era
ligar em uma unidade redentora
toda a sua amada criação. Jesus foi enviado para produzir a paz entre Deus e as pessoas, bem
como entre as pessoas e os povos. A realização desse grande propósito começou
com um encontro desagradável entre Jesus
e aqueles que praticamente moravam ao lado – os Samaritanos.
Os Samaritanos
Reconsiderar a mulher samaritana. As fontes nos apresentam, pelo menos, duas histórias diferentes
dos Samaritanos. Uma – de acordo com Samaritanos Israelitas, e a outra – de
acordo com Judeus Israelitas. Enquanto existem dificuldades sobre a
confiabilidade dos documentos antigos contaminados pela polêmica Judaica-
Samaritana, bem como a datação tardia das fontes de ambos os lados, algumas
coisas podem, contudo, ser estabelecidas. A estória Samaritana de sua história
e identidade correspondem aproximadamente ao seguinte:
1) Os Samaritanos
chamavam-se a si mesmos de Bnei Israel (Filhos de Israel).
2) Os Samaritanos
eram um grupo considerável de pessoas que acreditavam preservar a religião original do antigo
Israel. O nome Samaritano traduzido literalmente do hebraico significa Os
Guardiões (de leis e tradições originais). Embora seja difícil falar em números
concretos, a população Samaritana no tempo de Jesus era comparável àquela dos
Judeus e incluiu a grande diáspora.
3) Os Samaritanos
acreditavam que o centro de adoração de Israel não deveria ter sido o Monte
Sião, mas sim o Monte Gerizim. Eles argumentaram que este era o local do
primeiro sacrifício Israelita na Terra (Deut. 27: 4 ) e que continuou a ser o
centro da atividade sacrificial dos patriarcas de Israel. Este era o lugar onde
as bênçãos foram pronunciadas pelos antigos Israelitas. Os Samaritanos
acreditavam que Betel (Jacob), o Monte
Moriá (Abraão) e o Monte Gerizim eram o mesmo lugar.
4) Os Samaritanos
tinham essencialmente um credo
quádruplo: 1) Um Deus, 2) Um Profeta, 3) Um Livro e 4) Um Lugar.
5) Os Samaritanos
acreditavam que as pessoas que se chamavam Judeus (crentes no Deus de Israel
situados na Judéia) haviam tomado o caminho errado em sua prática religiosa
pela importação de novidades para a Terra durante o retorno do exílio Babilônico.
6) Os Samaritanos
autênticos rejeitaram a supremacia da dinastia Davídica em Israel. Eles
acreditavam que os sacerdotes levitas em seu templo eram os legítimos
líderes de Israel.
Agora que fizemos um
resumo parcial levando em conta o outro lado da história e as crenças dos
Samaritanos, vamos nos voltar para a versão Judaica da mesma história. Este
registro essencialmente origina-se de dois Talmuds e sua interpretação da
Bíblia Hebraica, de Josefo e do Novo Testamento.
1) Os Samaritanos
eram um grupo de pessoas com misturas teológicas e étnicas. Eles acreditavam em
um Deus único. Além disso, eles associavam seu Deus, com o Deus que deu a Torá
ao povo de Israel. Os Samaritanos são geneticamente relacionados aos
remanescentes das tribos do norte que foram deixados na terra após o exílio
Assírio. Eles se casaram com gentios,
que foram transferidos para Samaria pelo imperador Assírio. Este ato de desapropriação
e transferência de sua terra natal foi feito em uma tentativa estratégica de
destruir a identidade do povo e prevenir
qualquer potencial de futura revolta.
2) Nos escritos
rabínicos Judaicos, os Samaritanos são geralmente referidos pelo termo
“Kuthim.” O termo está provavelmente relacionado a um local no Iraque do qual
foram importados exilados não Israelitas para Samaria (2 Reis 17:24). O nome
Kuthim ou Kuthites (de Kutha) foi usado em contraste com o termo “Samaritanos”
(os guardiões da lei). Os escritos Judaicos enfatizaram a identidade
estrangeira da religião e prática Samaritanas, em contraste com a verdadeira fé
de Israel, que eles chamariam especialmente em um período posterior, como
Judaísmo Rabínico [1]. A interpretação rabínica dos Samaritanos não foi
totalmente negativa.
3) De acordo com 2
Crônicas 30:1-31:6, a alegação de que as tribos do norte de Israel foram todas
exiladas pelos Assírios e, portanto, aqueles que ocuparam a terra (Samaritanos)
eram de origem não Israelita é rejeitada em uma leitura mais atenta da Bíblia
Hebraica. Esta passagem diz que nem todas as pessoas do reino do norte foram
exiladas pelos Assírios. Alguns, talvez confirmando a versão Samaritana,
permaneceram mesmo após a conquista Assíria da terra no século 8 AC.
4) Os Israelitas
situados na Judéia (os Judeus) acreditam que não só os Samaritanos optaram por
rejeitar as palavras dos profetas a respeito supremacia de Sião e dinastia
Davídica, mas também deliberadamente
mudaram a própria Torá para ajustar sua teologia e práticas heréticas. Esta é
uma das visões que podem ser tiradas da comparação dos dois Pentateucos, a Torá
dos Samaritanos e a Torá dos Judeus. O texto Samaritano permite leitura muito
melhor do que o mesmo Judeu. Em alguns casos, as histórias da Torá Judaica
parecem truncadas, com pouca lógica e
fluxo narrativo não claro. Em contraste, os textos da Torá Samaritana parecem
ter um fluxo narrativo muito mais suave. Superficialmente, isto torna a Torá
Judaica problemática. Após uma análise mais aprofundada, no entanto, isso
poderia levar ao argumento de que o Pentateuco Samaritano seria uma revisão ou
edição tardia de texto Judaico anterior. Com base neste e em outros argumentos,
estamos de acordo com a visão Judaica
argumentando que a Torá Samaritana é uma revisão magistral e teologicamente
dirigida dos primeiros textos Judaicos correspondentes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário